O nome vulgar dessa espécie – 'sapo-andante' – remete diretamente a uma de sua características
singulares: como os braços são mais compridos do que as pernas, ela, quando se desloca sobre o folhiço
da mata, invariavelmente caminha a passos largos. Foto: João Luiz Gasparini.




Sapo-andante ou sapo-coruja

Macrogenioglottus alipioi
  Carvalho, 1946 (Amphibia: Anura)


João Luiz Gasparini & Antônio de Pádua Almeida


                                                                                                                                                                 (HABITAT 75 - DEZEMBRO 2004)



O sapo-andante ou sapo-coruja, Macrogenioglottus alipioi, é um anfíbio pertencente à ordem anura (anfíbios sem cauda). De grande porte, (aproximadamente 13 centímetros de comprimento), é endêmico do ecossistema Mata Atlântica, ocorrendo pontualmente nos estados da Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo, onde vive em trechos de floresta ainda preservados, preferencialmente em áreas inundáveis, adjacentes a corpos d´água.

A espécie foi descrita em 1946, pelo renomado e admirável naturalista Antenor Leitão de Carvalho, e até hoje causa polêmica entre os herpetólogos (cientistas que estudam os anfíbios e os répteis), pois há controvérsias sobre a que família pertence: à das rãs (Leptodactylidae) ou à dos sapos (Bufonidae). Talvez, a solução seja criar uma família exclusiva para esse gênero tão singular.

Os primeiros exemplares coletados, que serviram de base para a descrição da espécie, foram colecionados na Fazenda Pirataquisse, situada no município de Ilhéus, sul do estado da Bahia, outrora coberta pela exuberante Hiléia Baiana, tendo em seu sub-bosque, plantações de cacau, e que atualmente teve parte de sua área transformada em pastagens. O segundo relato da espécie, entretanto, só foi assinalado em 1993, com o encontro de exemplares num trecho de mata preservada em Ubatuba, estado de São Paulo, pelo pesquisador Rogério P. Bastos.

Segundo Carlos Alberto Gonçalves da Cruz (Professor Emérito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ), entretanto, o registro dessa espécie para o estado do Espírito Santo já tinha sido assinalado pelo pesquisador Augusto Ruschi, que encontrou uma população dessa espécie na localidade de Nova Lombardia, onde hoje está a belíssima Reserva Biológica Augusto Ruschi (Ibama). Em 1967, o professor Ruschi publicou uma listagem das espécies de anfíbios do ES, onde consta a referida espécie. Há também uma pesquisa realizada pelos pesquisadores J. P. Abrawaya e James F. Jackson na atual Rebio Augusto Ruschi, publicada no ano de 1978, e que trata da biologia reprodutiva desta espécie, incluindo descrição do seu canto nupcial e girino.

Há pouco tempo — aproximadamente dois anos —, os pesquisadores Adriano Chiarello e Antônio de Pádua Almeida, encontraram indivíduos dessa espécie em pequenos fragmentos de Mata Atlântica, situados no município de Linhares, ainda preservados graças a estarem associados ao cultivo de cacau.
































































Espécime de Macrogenioglottus alipioi do município de Linhares (ES).

Fotos: João Luiz Gasparini.



Impactos causados pelo avanço imobiliário descontrolado, aumento generalizado da poluição ambiental (esgotos, lixões, pesticidas), ampliações das áreas de plantios de eucaliptos, outras monoculturas rotativas e atividades agropecuárias, são ameaças constantes e crescentes à fauna e flora do bioma Mata Atlântica.

O sapo-andante ou coruja é um dos muitos exemplos de animais que estão sofrendo com a destruição desse nosso ecossistema. Como ele, muitas outras espécies, tanto animais, como vegetais, igualmente frágeis e importantes, estão desaparecendo ou já desapareceram do hotspot Mata Atlântica.






















Vista aérea da Mata de Aluvião no delta do Rio Doce, município de Linhares (ES),

uma das poucas regiões onde o sapo-andante ainda pode ser encontrado.


Foto: João Luiz Gasparini.




Esse artigo é dedicado à memória do ilustre naturalista brasileiro Antenor Leitão de Carvalho, e aos professores Eugenio Izecksohn e Carlos Alberto Gonçalves da Cruz.



Referências bibliográficas

Abrawaya, J.P. & Jackson, J.F. (1978) Reproduction in Macrogenioglottus alipioi
Carvalho (Anura: Leptodactylidae) Natural History Museum of Los Angeles County Contributions in Science 298: 1-9.

Baldissera, F. & Bastos, R.P. (1993) Análise cariotípica de Macrogenioglottus alipioi (Anura). III Congresso Latino Americano de Herpetologia, Campinas, São Paulo, Brasil. Resumos: 55p.

Carvalho, A.L. de (1946) Um novo Ceratofrideo do sudeste Baiano. Bol. Mus. Nac. Rio de Janeiro (N. S.) Zool. 73: 1-5, pls. 1-9.

Gallardo, J.M. (1965) A propósito de los Leptodactylidae (Amphibia, Anura). Papéis Avulsos do Depart. de Zoologia (Secretaria de Agricultura), São Paulo. 17(8): 77-87.

Reig, O.A. (1972) Macrogenioglottus and the South American bufonid toads, in W. F. Blair (ed.) Evolution In The Genus Bufo, Austin: Univ. Texas Press, pp. 14-36.




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