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Varanus varius. Foto: Gunther Schmida.



Varanos da Austrália



Gunther Schmida


                                                                                                                                                                                  (HABITAT 82 - ABRIL 2007)



Des­de os meus 13 anos, quan­do avis­tei os meus pri­mei­ros va­ra­nos, eu me apai­xo­nei por es­tes ma­ra­vi­lho­sos sáu­rios. Eram Va­ra­nus salvator sal­va­tor, o va­ra­no ma­laio, me­din­do apro­xi­ma­da­men­te dois me­tros que, na­que­la oca­sião, es­ta­vam acon­di­cio­na­dos em um ter­rá­rio bas­tan­te gran­de na no­va “Ca­sa Tro­pi­cal” do zoo­ló­gi­co de Han­no­ver. Bem, eu nem sa­bia que exis­tiam sáu­rios tão gran­des. Eu fi­quei mui­to en­tu­sias­ma­do e lo­go co­me­cei a pes­qui­sar mais sobre es­tes gi­gan­tes­cos rép­teis. A li­te­ra­tu­ra sobre es­tes ani­mais, na­que­la épo­ca, era bem ra­ra. Con­tu­do, achei ma­te­rial su­fi­cien­te para apren­der que os va­ra­nos ma­laios, por mim ad­mi­ra­dos, ainda não es­ta­vam to­tal­men­te de­sen­vol­vi­dos e que exis­tia um tipo de va­ra­no ainda maior em uma mi­nús­cu­la ilha da In­do­né­sia e ainda uma sé­rie de pe­que­nos va­ra­nos, os quais vi­viam, qua­se todos, na Aus­trá­lia. Por­tan­to, eu ti­nha de ir para lá de qual­quer modo! Dez anos se pas­sa­ram até que eu con­se­guis­se che­gar lá.

En­tre­men­tes, ainda co­nhe­ci me­lhor um outro va­ra­no du­ran­te a mi­nha épo­ca de es­ta­giá­rio, quan­do tra­ba­lhei como vo­lun­tá­rio no zoo­ló­gi­co de Brauns­chweig e era responsável, entre outros ani­mais, por um va­ra­no ama­re­lo, Va­ra­nus fla­ves­cens, que me­dia apro­xi­ma­da­men­te 70cm de com­pri­men­to. Eu, mui­tas ve­zes, fi­quei sur­pre­so com o fato de este va­ra­no, que su­pos­ta­men­te vi­ve nas zo­nas ári­das da Índia, pas­sar tanto tem­po den­tro de sua ba­nhei­ra. Ho­je te­mos co­nhe­ci­men­to de que es­ta es­pé­cie, efe­ti­va­men­te, le­va uma vi­da bas­tan­te “úmida”.

Co­nhe­ci outros re­pre­sen­tan­tes dessa fa­mí­lia, di­fun­di­da ape­nas no An­ti­go Con­ti­nen­te, em outros zoo­ló­gi­cos e aquá­rios da Ale­ma­nha e da Ho­lan­da. As­sim, por exemplo, o va­ra­no do Ni­lo, o va­ra­no das sa­va­nas e o va­ra­no do de­ser­to, res­pec­ti­va­men­te, Va­ra­nus ni­lo­ti­cus, V. exan­the­ma­ti­cus e V. griseus gri­seus, são todos re­pre­sen­tan­tes afri­ca­nos. Ha­via di­ver­sas for­mas do va­ra­no ma­laio e do va­ra­no de Ben­ga­la, V. sal­va­tor sp. e V. ben­ga­len­sis, da Índia e su­des­te da Ásia, o va­ra­no de Pa­pua, V. sal­va­do­rii, da No­va Gui­né, e até es­pé­cies aus­tra­lia­nas como os va­ra­nos ar­bo­rí­co­las, da areia e par­do, V. va­rius, V. gouldii goul­dii e V. se­mi­re­mex, res­pec­ti­va­men­te. En­tão, em ou­tu­bro de 1965, dei o “gran­de pas­so” em di­re­ção à Austrália.


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Tabuleiros Rochosos - interior da Austrália. Habitat de Varanus giganteus, V. panoptes panoptes e V. tristis orientalis.               Foto: Gunther Schmida.



Com ba­se no que eu ha­via li­do e ou­vi­do, eu já es­pe­ra­va avis­tar os meus pri­mei­ros va­ra­nos ar­bo­rí­co­las (Va­ra­nus va­rius) no ae­ro­por­to de Sydney. Er­rei por mui­to! Em­bo­ra eu ti­ves­se en­tra­do ime­dia­ta­men­te em con­ta­to com di­ver­sos cria­do­res de rép­teis em Sydney, dos quais mui­tos man­ti­nham va­ra­nos e com quem pas­sei mui­to tem­po na “ma­ta” nos me­ses que se se­gui­ram, eu só vi o meu pri­mei­ro va­ra­no, no am­bien­te sel­va­gem, exa­ta­men­te um ano após a mi­nha che­ga­da na­que­la cidade.

Es­ta­va com um ami­go na es­tra­da de Glads­to­ne para Roc­khamp­ton, per­to da cos­ta da re­gião cen­tral de Queens­land, quan­do su­bi­ta­men­te cru­za­mos com um va­ra­no ar­bo­rí­co­la, Va­ra­nus va­rius, de cer­ca de um me­tro, a uma dis­tân­cia de 50 me­tros da es­tra­da. Nós frea­mos o car­ro com tan­ta for­ça que ami­gos que nos se­guiam ti­ve­ram di­fi­cul­da­de de pa­rar em tem­po há­bil. Mas a an­sie­da­de era mui­to gran­de. O va­ra­no, após atra­ves­sar a es­tra­da, ti­nha ime­dia­ta­men­te su­bi­do em uma ár­vo­re e nos ob­ser­va­va a uma al­tu­ra segura.

Co­mo ne­nhum de nós pos­suía o mí­ni­mo co­nhe­ci­men­to de como um va­ra­no desse tipo pu­des­se ser cap­tu­ra­do sem ser­mos mor­di­dos ou ar­ra­nha­dos, de­mo­rou um pou­co até que ti­vés­se­mos “do­ma­do” o rép­til. No fi­nal, es­tá­va­mos todos ar­ra­nha­dos e só não ha­vía­mos si­do mor­di­dos por sor­te. Era um ani­mal de co­lo­ra­ção bas­tan­te es­cu­ra, com man­chas ama­re­las e lis­tras bem uni­das. Na­tu­ral­men­te, o rép­til foi fo­to­gra­fa­do de todos os la­dos an­tes que o li­be­rás­se­mos. Pa­ra ser sin­ce­ro, ho­je eu não te­ria mais or­gu­lho das fo­tos e elas já fo­ram pa­rar no li­xo há mui­to tempo.

Mas o fei­ti­ço ha­via si­do que­bra­do. Em­bo­ra, a prin­cí­pio, eu não ti­ves­se mais avis­ta­do va­ra­nos ar­bo­rí­co­las, du­ran­te uma via­gem ao Mon­te Isa, no no­roes­te de Queens­land, um va­ra­no de Ar­gus, Va­ra­nus pa­nop­tes
pa­nop­tes, de um me­tro e meio, atra­ves­sou o meu ca­mi­nho (o no­me pa­nop­tes, na­que­la épo­ca, ainda não era co­nhe­ci­do e todos os va­ra­nos da­que­le tipo eram cha­ma­dos de goul­dii). O rép­til poderia ter es­ca­pa­do sem problemas. Ele ha­via su­mi­do por uma ve­ge­ta­ção den­sa, que ti­nha uma al­tu­ra de ape­nas um me­tro. Eu já que­ria con­ti­nuar a via­gem quan­do o ob­ser­vei es­ca­lan­do uma pe­que­na ár­vo­re se­ca a cer­ca de 100 me­tros. O va­ra­no não fez men­ção de es­ca­par e pô­de ser cap­tu­ra­do sem gran­de esforço.


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Varanus panoptes panoptes, 150cm comprimento, nas proximidades de Winton,
área central de Queensland. Foto: Gunther Schmida.



Pou­co de­pois, eu também cap­tu­rei o pri­mei­ro va­ra­no de Spen­cer, Va­ra­nus spen­ce­ri. In­fe­liz­men­te, fal­ta­va no rép­til qua­se a me­ta­de de seu ra­bo, o qual nes­ta es­pé­cie já é cur­to, o que me de­cep­cio­nou um pou­co. An­te­rior­men­te, du­ran­te uma via­gem através da re­gião de in­ci­dên­cia deste ani­mal, as ‘black-soil plains’ (pla­ní­cies de ter­ra es­cu­ra), no no­roes­te de Queens­land, pu­de ob­ser­var, em um dia, 27 exem­pla­res deste rép­til que fo­ram atro­pe­la­dos por car­ros, sem ter avis­ta­do um único exem­plar vi­vo. En­tre­men­tes, con­tu­do, eu já ha­via ti­do mui­to mais sor­te nos en­con­tros com essa espécie.


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Varanus giganteus atropelado. Foto: Gunther Schmida.



Na Aus­trá­lia cen­tral, avis­tei o meu pri­mei­ro be­lís­si­mo exem­plar do va­ra­no da areia, Va­ra­nus goul­dii fla­vi­ru­fus, que es­ta­va es­ca­van­do com tal con­cen­tra­ção no meio da pis­ta que só to­mou ciên­cia da mi­nha exis­tên­cia quan­do o se­gu­rei pe­lo rabo.


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Varanus gouldii gouldii. Os varanos do grupo Varanus gouldii possuem o hábito
de se elevar nas patas traseiras. Foto: Gunther Schmida.



Per­to de Dar­win, eu ob­ser­vei e cap­tu­rei os meus pri­mei­ros va­ra­nos aquá­ti­cos de Mer­tens, Va­ra­nus mer­ten­si, sen­do que o se­gun­do ani­mal es­ta­va co­men­do sal­si­chas quei­ma­das e os­sos de chur­ras­co aban­do­na­dos por ex­cur­sio­nis­tas de fim de se­ma­na. Is­so foi em Berry Springs, on­de ho­je existe um bo­ni­to zoo­ló­gi­co. Em 1968, foi lá também que eu en­con­trei o meu pri­mei­ro va­ra­no anão sob um blo­co ro­cho­so, ti­nha um diâ­me­tro de apro­xi­ma­da­men­te 40cm. Era um Va­ra­nus pri­mor­dius com um com­pri­men­to to­tal de 25cm. Somente três ani­mais ha­viam si­do vis­tos até então.


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Acima, paisagem típica de rio na Austrália tropical, onde se pode encontrar Varanus mertensi (foto ao lado) e V. mitchelli, ambos dentro d'água. Fotos: Gunther Schmida.






















Pou­co de­pois, eu es­ta­va em Char­ters To­wers, uma pe­que­na ci­da­de no no­roes­te de Queens­land, e vi­si­ta­va o ter­ra­rió­fi­lo lá re­si­den­te, Alan Ur­qu­hart, que man­ti­nha um pe­que­no zoo­ló­gi­co particular. Ele me le­vou ao ha­bi­tat de Va­ra­nus storri stor­ri, um outro va­ra­no anão. Lá, em uma pe­que­na la­vra aban­do­na­da, en­con­tra­mos 14 des­tes va­ra­nos de até 30cm de com­pri­men­to, no pe­río­do de uma hora.

Quan­do es­ta­va a ser­vi­ço na pe­nín­su­la de Go­ve, no no­roes­te de Ar­nhem, no ter­ri­tó­rio nor­te, en­con­trei di­ver­sos va­ra­nos ar­bo­rí­co­las man­cha­dos, Va­ra­nus sca­la­ris.  Na­que­la épo­ca, es­ta es­pé­cie era co­nhe­ci­da como V. ti­mo­ren­sis si­mi­lis. To­dos vi­viam em ár­vo­res. Lá também se me de­pa­rei com um va­ra­no de ca­be­ça ama­re­la, Va­ra­nus tris­tis orientalis.


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Varanus tristis tristis
. Fotografado em Dajarra, noroeste de Queensland. Foto: Gunther Schmida.


Na cos­ta sul do oes­te da Aus­trá­lia, eu avis­ta­ria o meu pri­mei­ro Va­ra­nus ro­sen­ber­gi. São exem­pla­res real­men­te mag­ní­fi­cos, me­din­do 1,2m de com­pri­men­to e qua­se in­tei­ra­men­te pre­tos, con­tu­do, não con­se­gui fa­zer uma úni­ca fo­to boa de­les. Um pou­co mais ao nor­te, per­to de Perth, eu ob­ser­vei a es­pé­cie re­si­den­te do va­ra­no da areia, Va­ra­nus gouldii goul­dii. Não mui­to dis­tan­te de lá, vi um va­ra­no de ca­be­ça ne­gra, Va­ra­nus tristis tris­tis, to­tal­men­te pre­to, que se ba­nha­va ao Sol jus­ta­men­te sobre o cor­ri­mão bran­co da pon­te, não po­den­do dei­xar de ser visto.


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Varanus rosenbergi. Fotografado na área de preservação de Coorong.
Foto: Gunther Schmida.


Em al­tas es­ta­cas de cer­cas em tor­no de cam­pos de tri­go, per­to do Par­que Na­cio­nal de Kal­bar­ri, se me de­pa­rei com os pri­mei­ros va­ra­nos de cau­da lis­tra­da, Va­ra­nus cau­do­li­nea­tus, e, in­di­re­ta­men­te, eles me aju­da­ram a en­con­trar o meu pri­mei­ro va­ra­no de cau­da cur­ta, V. bre­vi­cau­da, o qual, mais tar­de, con­se­gui re­pro­du­zir duas vezes.

Na re­gião de Pil­ba­ra, no oes­te aus­tra­lia­no, en­con­trei os meus pri­mei­ros va­ra­nos de cau­da es­pi­nho­sa, Va­ra­nus acan­thu­rus brach­yu­rus, tanto na for­ma co­lo­ri­da, quan­to na mo­no­cro­má­ti­ca ver­me­lho-fer­ru­gem (ho­je acre­di­to que os ani­mais mo­no­cro­má­ti­cos eram V. stor­ri ocrea­tus). No Mon­te New­man, no cen­tro do país, eu achei no­va­men­te Va­ra­nus cau­do­li­nea­tus em pe­que­nos ga­lhos se­cos de eu­ca­lip­tos es­ca­va­dos por cu­pins, mas ape­nas um pou­co mais ao nor­te, no lei­to do Rio For­tes­que, pu­de en­con­trar a es­pé­cie re­la­cio­na­da V. gil­le­ni em acá­cias. Nes­ta re­gião, di­ver­sos exem­pla­res do va­ra­no Ar­gus, Va­ra­nus pa­nop­tes ru­bi­dus, cru­za­ram o meu ca­mi­nho. Do maior va­ra­no aus­tra­lia­no, Pe­ren­tie, Va­ra­nus gi­gan­teus, eu, in­fe­liz­men­te, só en­con­trei indivíduos atro­pe­la­dos. O maior des­tes rép­teis pos­suía 1,82m de com­pri­men­to e ainda da­va os seus úl­ti­mos sus­pi­ros. Ele ha­via cor­ri­do para de­bai­xo de um ca­mi­nhão que an­da­va apro­xi­ma­da­men­te 500 me­tros à mi­nha frente. Eu ainda avis­ta­ria duas ou­tras es­pé­cies de va­ra­no nes­sa área. De Va­ra­nus ere­mius, vi três entre o ca­pim, em so­lo are­no­so, sem ter con­se­gui­do cap­tu­rar um único exemplar.

Dois ami­gos meus avis­ta­ram o pri­mei­ro va­ra­no de Pil­ba­ra, Va­ra­nus pil­ba­ren­sis, em uma pla­ta­for­ma ro­cho­sa, no al­to de um mor­ro, na mar­gem sul do Rio Grey, on­de ha­vía­mos ido pes­car. A es­pé­cie ainda não ha­via si­do des­cri­ta na­que­la épo­ca (1971) e achá­va­mos es­tar dian­te de uma for­ma co­lo­ri­da do va­ra­no de ca­be­ça ne­gra, V. tristis tris­tis. Eu o man­ti­ve co­mi­go por di­ver­sos me­ses an­tes de ce­dê-lo a um ami­go. Ele também não re­co­nhe­ceu que se tra­ta­va de uma no­va espécie.

Na re­gião de Kim­ber­ley, no no­roes­te do con­ti­nen­te, en­con­trei o meu pri­mei­ro Va­ra­nus gle­bo­pal­ma dor­min­do em uma ca­ver­na, ten­do ainda vis­to es­ta es­pé­cie em mui­tos lo­cais nos tró­pi­cos. Do va­ra­no de cau­da lar­ga das ro­chas, Va­ra­nus glauer­ti, que também ha­bi­ta essa re­gião, só ob­ser­vei, até ago­ra, uma parte de sua cau­da sobre uma pla­ta­for­ma ro­cho­sa es­trei­ta. Foi ainda nes­se lo­cal que vi o meu pri­mei­ro va­ra­no aquá­ti­co de Mit­chell, Va­ra­nus mit­chel­li, e o meu úl­ti­mo, no Rio Gre­gory, no no­roes­te de Queensland.


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Varanus glebopalma. Monte Isa, noroeste de Queensland. Foto: Gunther Schmida.


Du­ran­te os 14 anos que vi­vi em Sydney, de­fron­tei-me di­ver­sas ve­zes com a es­pé­cie do va­ra­no de Ro­sen­berg, Va­ra­nus ro­sen­ber­gi, uma es­pé­cie que real­men­te não é en­con­tra­da com fre­quên­cia. Na­que­la épo­ca, a cha­má­va­mos de va­ra­no de Gould de Sydney. O va­ra­no ar­bo­rí­co­la co­mum, Va­ra­nus va­rius, eu avis­ta­va com fre­quên­cia, prin­ci­pal­men­te du­ran­te as mi­nhas via­gens ao in­te­rior de­sér­ti­co, no oes­te do Estado de New South Wa­les (NSW), on­de es­ta es­pé­cie é bas­tan­te co­mum nas ma­tas de ga­le­ria jun­to ao cur­so dos rios, ocor­ren­do em dois ti­pos de co­lo­ra­ção: o nor­mal, com lis­tras es­trei­tas de man­chas ama­re­las e pre­tas, e um outro, com lis­tras pre­tas e ama­re­las bas­tan­te lar­gas, for­ma cha­ma­da de Bells.
Há al­guns anos, um ami­go e eu cap­tu­ra­mos, nes­sa mes­ma re­gião, o maior va­ra­no ar­bo­rí­co­la que ja­mais me­di­mos. Era um in­di­ví­duo ido­so, qua­se in­tei­ra­men­te ne­gro, de 2,17m de com­pri­men­to, que apre­sen­ta­va uma sé­rie de ci­ca­tri­zes an­ti­gas. Es­te ani­mal imen­so foi então man­ti­do, por um outro ami­go, em um re­cin­to aber­to. Um dia, sem que pu­dés­se­mos pre­ci­sar como, este rép­til es­ca­pou e es­ca­lou um pos­te de al­ta ten­são nas pro­xi­mi­da­des da ca­sa de­le. Após este even­to, apro­xi­ma­da­men­te 300 mil ha­bi­tan­tes do bair­ro em que ele mo­ra­va, em Sydney, fi­ca­ram sem ener­gia elé­tri­ca por qua­tro ho­ras, e is­to acon­te­ceu à noi­te, du­ran­te o pre­pa­ro do jan­tar. Es­se foi o tem­po necessário para re­cap­tu­rar­mos o va­ra­no. Des­de então, nun­ca mais avis­tei um va­ra­no ar­bo­rí­co­la com es­sas di­men­sões. Nor­mal­men­te, eles pos­suem um com­pri­men­to de 180 cm.


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Varanus varius. Um "velho campeão", forma de Bells, fotografado em Taroom,
sul da região central de Queensland. Foto: Gunther Schmida.


No oes­te de NSW, também vi os meus pri­mei­ros va­ra­nos da areia, da es­pé­cie no­mi­nal, Va­ra­nus gouldii goul­dii, o qual é en­con­tra­do no nor­te deste estado e em Queens­land até a cos­ta, ocor­ren­do ainda em algumas ilhas. A ter­cei­ra es­pé­cie da área é do am­pla­men­te di­fun­di­do va­ra­no ne­gro, Va­ra­nus tristis tris­tis, que aqui é en­con­tra­do ape­nas em uma for­ma com co­lo­ra­ção ne­gra na ca­be­ça e no ra­bo. O cor­po é nor­mal­men­te bas­tan­te colorido.

Con­for­me pode ser cons­ta­ta­do do tex­to aci­ma, eu pas­sei os meus pri­mei­ros anos na Aus­trá­lia via­jan­do cons­tan­te­men­te e vi­vi nas mais di­fe­ren­tes áreas. Mais pre­ci­sa­men­te, aon­de eu po­dia en­con­trar va­ra­nos que ainda não ha­via vis­to. Eu sim­ples­men­te me can­di­da­ta­va a em­pre­gos em seu ha­bi­tat e, então, pas­sa­va al­gum tem­po na re­gião para po­der lo­ca­li­zar os rép­teis. Na maio­ria das ve­zes, ti­ve sor­te. Eu também pos­suía ter­rá­rios, que eram com­pos­tos de par­tes fa­cil­men­te mon­tá­veis – sem­pre os le­va­va co­mi­go, pois me pos­si­bi­li­ta­vam man­ter as es­pé­cies me­no­res no lo­cal de sua in­ci­dên­cia. Quan­do, fi­nal­men­te, me ins­ta­lei em Sydney, não pu­de fi­car sem ter­rá­rios. Aliás, nes­sa épo­ca, também mon­tei di­ver­sos aquá­rios. Pei­xes e sa­pos já me in­te­res­sa­vam des­de os pri­mór­dios da mi­nha ju­ven­tu­de e, na Aus­trá­lia, ha­via mui­to a ser des­co­ber­to nes­se cam­po. Além dis­so, exis­tia o fato de que a ma­nu­ten­ção de rép­teis na maio­ria dos es­ta­dos aus­tra­lia­nos, em vir­tu­de das leis de pre­ser­va­ção, era bas­tan­te di­fi­cul­ta­da. Co­mo aqua­ris­ta, ainda ho­je é pos­sí­vel man­ter sem problemas uma enor­me quan­ti­da­de de pei­xes exó­ti­cos e en­dê­mi­cos. Por outro lado, a ma­nu­ten­ção de rép­teis e an­fí­bios exó­ti­cos é to­tal­men­te ile­gal, e mes­mo a maio­ria dos rép­teis en­dê­mi­cos só pode ser man­ti­da com li­cen­ça. Por sor­te, essa situação me­lho­rou um pou­co nos úl­ti­mos tempos.

Co­mo eu também ha­via for­ma­do mi­nha fa­mí­lia, du­ran­te os anos em Sydney, e por este mo­ti­vo não dis­pu­nha mais de tanto tem­po quan­to an­tes para per­ma­ne­cer na na­tu­re­za, eu me con­ten­tei, em pri­mei­ra ins­tân­cia, com a ma­nu­ten­ção de va­ra­nos anões em ter­rá­rio. Fo­ram Va­ra­nus bre­vi­cau­da, V. cau­do­li­nea­tus, V. gil­le­ni, V. pri­mor­dius e V. storri stor­ri. Co­mo já re­la­tei, ob­ti­ve su­ces­so duas ve­zes com a re­pro­du­ção de V. bre­vi­cau­da. Va­ra­nus gil­le­ni e V. cau­do­li­nea­tus também me fi­ze­ram es­se fa­vor, ainda que sem su­ces­so, por mo­ti­vos téc­ni­cos. Dos va­ra­nos de maior por­te, man­ti­ve os ho­je tão apre­cia­dos Va­ra­nus acan­thu­rus brach­yu­rus, V. tris­tis orien­ta­lis, V. sca­la­ris e uma for­ma do Ather­ton Ta­ble­land, do nor­te de Queens­land, a qual, na épo­ca, con­si­de­ra­va uma for­ma da flo­res­ta tro­pi­cal de V. ti­mo­ren­sis si­mi­lis. Há al­guns anos, eu vi no­va­men­te um desses ani­mais, in­fe­liz­men­te, com al­to grau de sub­nu­tri­ção, e es­tou con­ven­ci­do de que se tra­ta da es­pé­cie V. si­mi­lis, ou que tal­vez se tra­te de uma es­pé­cie não des­cri­ta. De qual­quer for­ma, este va­ra­no pa­re­ce es­tar mais re­la­cio­na­do com V. tris­tis do que com V. sca­la­ris. Ti­ve ainda a opor­tu­ni­da­de de tra­tar de um Va­ra­nus pra­si­nus, da No­va Gui­né, que per­ten­cia a um ami­go e se acha­va bas­tan­te de­bi­li­ta­do, an­tes que o mes­mo ti­ves­se vol­ta­do ao seu proprietário.


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Varanus gilleni. Fotografado em galho de eucalipto, Soudan Station,
Barkly Tableland, Território Norte da Austrália. Foto: Gunther Schmida.


Du­ran­te essa épo­ca, eu também aju­da­va re­gu­lar­men­te um ami­go que pos­suía di­ver­sas es­pé­cies en­dê­mi­cas de va­ra­nos de gran­de por­te em gran­des ter­rá­rios e ins­ta­la­ções ao ar li­vre. Is­to me deu a opor­tu­ni­da­de de me de­di­car com mais afin­co a esses rép­teis. Por mais de 20 anos, eu vi­vi em um ter­re­no de um hec­ta­re no su­des­te de Queens­land. Lá ocor­rem 27 es­pé­cies de rép­teis, também va­ra­nos ar­bo­rí­co­las, Va­ra­nus va­rius, que, aliás, eram di­fi­cil­men­te vis­tos. Mas, de­vo con­fes­sar que o meu in­te­res­se por va­ra­nos fi­cou ador­me­ci­do du­ran­te al­guns anos. Somente em 1999, quan­do fui a tra­ba­lho para Ri­vers­leigh, no Rio Gre­gory, on­de pu­de ob­ser­var di­ver­sas ve­zes V. mer­tensi, o meu in­te­res­se se reavivou.

Quan­do, em 2000, apre­sen­tou-se a pos­si­bi­li­da­de de tra­ba­lho, por seis me­ses, no Mon­te Isa, eu apro­vei­tei a opor­tu­ni­da­de jun­to com mi­nha es­po­sa. No to­can­te aos va­ra­nos, se­ria a parte mais in­te­res­san­te de mi­nha vi­da. Em 26 dias de fé­rias, entre os me­ses de mar­ço e se­tem­bro, pu­de lo­ca­li­zar, ob­ser­var e fo­to­gra­far um to­tal de 173 va­ra­nos de 10 es­pé­cies di­fe­ren­tes, em seu ha­bi­tat. Mui­tas ve­zes, com uma dis­tân­cia de fo­co bas­tan­te ampla, o que me foi útil para ti­rar algumas de mi­nhas me­lho­res fo­tos. A es­pé­cie mais co­mum era Va­ra­nus acan­thu­rus brach­yu­rus, da qual eu lo­go en­con­trei 121 exem­pla­res de todos os tamanhos.


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Varanus acanthurus brachyurus. Fotografado em Monte Isa, noroeste de Queensland. O espécime está tomando banho de sol sobre um cupinzeiro. Foto: Gunther Schmida.


Nos úl­ti­mos anos, sur­giu uma sé­rie de no­vos li­vros sobre va­ra­nos. Os va­ra­nos aus­tra­lia­nos – e aqui vi­vem, como já men­cio­nei, 28 das es­pé­cies re­co­nhe­ci­das – estão sen­do re­la­ti­va­men­te bem re­tra­ta­dos, prin­ci­pal­men­te se con­si­de­rar­mos que a Aus­trá­lia, há qua­se 40 anos, não per­mi­te mais a ex­por­ta­ção le­gal desses ani­mais. Não foi o que es­ta­va con­ti­do nos li­vros o que me es­ti­mu­lou a es­cre­ver este ar­ti­go, mas sim o que não está con­ti­do nos mesmos.

Con­tri­buiu também o fato de que, re­cen­te­men­te, após 27 anos, eu ter ti­do sob os meus cui­da­dos, no­va­men­te, um va­ra­no de cau­da cur­ta, Va­ra­nus bre­vi­cau­da, que era de um ami­go. Es­te va­ra­no, que ten­do uma mé­dia de 20cm de com­pri­men­to é con­si­de­ra­do o me­nor de todos os va­ra­nos, foi man­ti­do por mim du­ran­te se­te anos e re­pro­du­zi­do duas ve­zes. Ele é um dos meus pre­fe­ri­dos. A es­pé­cie é ho­je re­pro­du­zi­da por mui­tos ter­ra­rió­fi­los aus­tra­lia­nos e é tão pro­cu­ra­da que ainda são pa­gos pre­ços as­tro­nô­mi­cos por ela. Mas, como acon­te­ce com mui­tas ou­tras es­pé­cies de va­ra­nos já re­pro­du­zi­das em ca­ti­vei­ro, em bre­ve, es­ta também de­ve­rá es­tar dis­po­ní­vel a pre­ços mó­di­cos. E é pos­sí­vel que as au­to­ri­da­des aus­tra­lia­nas um dia até es­te­jam em con­di­ção de per­mi­tir a ex­por­ta­ção desses ani­mais. De qual­quer for­ma, na Aus­trá­lia, os va­ra­nos não se en­con­tram amea­ça­dos pe­lo trá­fi­co de ani­mais, mas em vir­tu­de do avan­ço da per­da de seu ha­bi­tat e pe­lo au­men­to do trá­fe­go nas es­tra­das. Em am­bos os ca­sos, na­tu­ral­men­te, não são afe­ta­dos ape­nas os va­ra­nos, mas to­das as for­mas de vida.

Es­te ar­ti­go de­ve­rá se tor­nar uma sé­rie es­po­rá­di­ca, através da qual eu apre­sen­ta­rei to­das as mi­nhas ob­ser­va­ções fei­tas na na­tu­re­za sobre os ti­pos de va­ra­nos aus­tra­lia­nos com os quais eu ti­ve con­ta­to, bem como as mi­nhas ex­pe­riên­cias. Por oca­sião da re­da­ção deste ar­ti­go, es­tive pla­ne­jan­do uma lon­ga ex­cur­são que pos­si­vel­men­te me le­ve a to­das as re­giões da Aus­trá­lia, du­ran­te a qual eu es­pe­ro en­con­trar os pou­cos va­ra­nos que ainda não vi em vi­da.

Prin­ci­pal­men­te, eu es­pe­ro, en­fim, po­der avis­tar al­guns exem­pla­res vi­vos do va­ra­no gi­gan­te aus­tra­lia­no, Va­ra­nus gi­gan­teus, e, na­tu­ral­men­te, também po­der fa­zer algumas fo­tos. Ele não é nem de per­to tão gran­de quan­to o va­ra­no que já ha­bi­tou a Aus­trá­lia, um ani­mal real­men­te gi­gan­te, me­din­do até seis me­tros de com­pri­men­to, de­no­mi­na­do Va­ra­nus (Me­ga­la­nia) pris­cus, o qual não pode nem mes­mo ser com­pa­ra­do ao dra­gão de Ko­mo­do, V. ko­mo­doen­sis. Ain­da as­sim, eu mal pos­so es­pe­rar por en­con­trar um va­ra­no gi­gan­te em seu ha­bi­tat. Es­pe­ro que dê tu­do certo.


                                                                                                              TRADUÇÃO: FRAUKE ALLMENROEDER.



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Nessa região, coberta de blocos de granito, cerca de 20 quilômetros do Monte Isa, o autor encontrou Varanus acanthurus brachyurus, V. storri ocreatus, V. tristis orientalis, V. panoptes panoptes, e mesmo V. glebopalma.
Foto: Gunther Schmida.



Agradecimentos


Eu só pu­de co­nhe­cer os va­ra­nos com a aju­da de ami­gos. Gos­ta­ria então de agra­de­cer, es­pe­cial­men­te, a Terry Adams, John Cann, Rob Car­roll, John Ed­wards, Ralph Fors­ter, Brian Han­cock, Paul Hor­ner, Uwe Gull, Pe­ter Krauss, Ro­bert Por­ter, Ste­ve Swan­son, Da­ve Wil­son e Ste­ve Wilson.


Bibliografia

Cog­ger, H.G. (2000) Rep­ti­les & Am­phi­bians of Aus­tra­lia. Sydney.

Eh­mann, H. (1992) Ency­clo­pe­dia of Aus­tra­lian Ani­mals, Rep­ti­les. Sydney.

Ei­den­mül­ler, B. (2003) Wa­ra­ne. Offenbach.

Schmi­da, G. (1985) The Cold-bloo­ded Aus­tra­lians. Sydney.

Wil­son, S.K. & Swan, G. (2003) A Com­ple­te Gui­de to Rep­ti­les of Aus­tra­lia. Sydney.

— & Kno­wles,
D. (1988) Aus­tra­lia’s Rep­ti­les. Sydney.





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